Acho que aquela música, Janaína, do Biquini Cavadão, cabe muito bem no que pensei para este post. Janaína acorda todo dia às quatro e meia
e já na hora de ir pra cama, Janaína pensa
que o dia não passou
que nada aconteceu
Janaína é passageira
Passa as horas de seus dias em trens lotados
Filas de supermercado, bancos e repartições
A rotina de Janaína é como a rotina da maioria das pessoas do mundo todo. Vivem para o trabalho. É o trabalho como vida que Dietmar Kamper relatou em seu livro. É a vida da pós-modernidade. Nossos trabalhos roubaram nossas existências, roubaram aquele tempo de ficar a sós consigo mesmo, roubaram parte dos vínculos, dispersaram as amizades. E as novas tecnologias que prometiam a libertação, nos aprisionaram de uma forma, que não conseguimos escapar, independente para onde fugirmos. O capitalismo nos capturou de tal forma que nos sobra afazeres, mas nos falta vida. Essência. É uma falsa ilusão de que ocupar nosso tempo com inúmeros afazeres é sinônimo de felicidade. É sempre preciso estar fazendo algo. Viramos robôs, máquinas, que executam suas tarefas com precisão e velocidade, mas sem a possibilidade de absorção. Absorção esta que nos permite nos conectar com nosso mais profundo âmago, nossa identidade. Estamos perdendo nossas identidades. A persona profissional a engoliu. Nos tornamos sistemáticos, fantoches, bonecos programados para coexistir. É preciso seguir uma planilha, uma cartilha, é preciso cumprir as regras apenas para pagar nossas contas no final do mês. Quando um amigo querido telefona, sempre adiamos o encontro. O cansaço nos consome, nos definha, nos faz sonhar apenas com uma cama macia ao final do dia. Dormir é desligar a máquina, o que nos provoca alívio. E no final, somos todos uma legião de Janaínas, que têm a vida projetada para pagar as contas no final do mês, e não vê a hora de chegar em casa para desligar a máquina com uma curta noite de sono. E quando encosta a cabeça no travesseiro se questiona: o dia não passou, nada aconteceu.
Claudia Sciré says:
ontem mesmo ouvi um comercial no rádio de um produto (tipo regulador de intestino) que dizia o seguinte: “a vida agitada de hoje deixa seu intestino preguiçoso, use Tamarine”. A história narrada é o seguinte: a pessoa está tão ocupada pelos afazeres de trabalho dela que esquece/ posterga a ida ao banheiro toda vez que sente vontade. Para além do desconforto de ouvir um história tão íntima levada a público em um comercial, grave é pensar como até este tempo precioso da vida acaba sendo tomado…
Sabrinah Giampá says:
Daria até outro post: intestinos negados. Porque abrir mão até mesmo das necessidades fisiológicas em nome da pró-atividade é o cúmulo do absurdo!