Com o avanço da era da democratização da beleza e a força tarefa de feministas e militância negra na internet, o movimento em prol dos cabelos naturais  pegou a grande mídia e indústria cosmética de surpresa. O fenômeno recém apresentado como uma ‘nova moda’ está longe de ser  um modismo, e nós cacheadas, crespas, e até mesmo onduladas, sabemos muito bem. Assumir nossos cabelos naturais para nós mesmas e para o mundo está muito aquém do que ditam como moda, assumir o cabelo natural numa sociedade onde a ditadura da beleza enaltece o longo e liso para uma multidão predominantemente crespa,  é um ato político, que confronta simultaneamente o racismo e o machismo, e temos orgulho de fazer parte desta mudança.

mulher empoderada

Para quem não conhece a minha história (vide O Livro dos Cachos, 2016- Editora Paralela), também passei por todo este processo de resgate da verdadeira  identidade através do meu cabelo natural.  Poder se enxergar no espelho sem todos os ‘filtros’ que era ‘acostumada’ a aturar: como alisamentos, chapinhas e afins, é decididamente muito libertador e empoderador. E isso me fez questionar essa lavagem cerebral que sofremos desde a mais tenra infância e o quanto isso é cruel e mutilador, principalmente com as crianças negras.

Todos queremos ser aceitos, amados e integrados pela sociedade em que vivemos, e sabemos o quanto é difícil sentir isso estando fora dos ‘moldes’ que são estabelecidos desde cedo, quando até mesmo a televisão definia o padrão de beleza das princesas disney e celebridades das quais deveríamos seguir. Queimamos nossos cabelos e couro cabeludo com o calor de ferro quente e alisamentos cancerígenos simplesmente para sermos aceitas, como se tivéssemos uma doença contagiosa pelo simples fato de ter o cabelo diferente do padrão.

Sou do tempo que não havia nada específico para cachos no mercado e nem ao menos cremes para pentear, o que também contribuiu para que acreditássemos que nossos cabelos eram inadequados e que nos tornássemos reféns de todo tipo de química agressiva. Hoje em dia, essa proporção de produtos tidos como específicos é tão grande quanto a infinidade de alisamentos ainda disponíveis e seus nomes sedutores, que só se multiplicam: selagem, botox, cauterização, escova de todos os sabores e nacionalidades. (conheço diversas cacheadas que passaram por estes processos acreditando que eram tratamentos naturais e tiveram seus cachos esticados contra a vontade).

meio liso, meio cacheado

A partir do momento que consegui integrar minhas duas profissões, a de jornalista e cabeleireira, para colocar a mão literalmente na massa capilar e ajudar outras mulheres, sob um novo prisma, a se libertarem deste estigma, começo a perceber um boom frenético da indústria tentando acompanhar nosso progresso. O mais inédito é que em pouquíssimo tempo, já havia uma gama tão variada de produtos específicos no mercado que muitas cacheadas começaram a comemorar. Afinal: “Finalmente nos enxergaram!” Como cacheada e expectadora, confesso que também cheguei a comemorar ingenuamente esta nova gama de possibilidades, mas como cabeleireira especialista em cachos, mal sabia que o pior ainda estava por vir.

Com o tempo e resultados assustadores que começaram aparecer em minha garagem, comecei a refletir sobre o assunto, e pude constatar que muitas marcas que até meses atrás se diziam ‘experts’ em produtos para pós-alisamentos  se tornaram da noite para o dia especializada em produtos liberados para as rotinas ‘no poo e low poo‘, idealizadas pela marca Deva Curl (que também tem a patente dessas marcas por também possuir produtos homônimos). Essa rotina de cuidados surgiu de anos de pesquisa sobre como cuidar do cabelo cacheado, sobre substâncias que danificam e que salvam os cachos. A marca não foi simplesmente ‘cuspida’ no mercado para entender uma ‘demanda inesperada’, mas foi estudada, pensada, testada, avaliada, para assim entrar no mercado com integridade e qualidade. (Não vem ao caso nessa matéria discutir como a Deva Curl conduziu a questão das patentes no Brasil).

OWWI2174[1]

Na primeira foto o cabelo da cliente após tratamento com produtos adequados. Na segunda, após alguns meses usando linhas comerciais destinadas para a rotina de cuidados de cabelos cacheados. O ressecamento é evidente. Em alguns casos, o cabelo não recupera a capacidade de absorção de água nem nos primeiros tratamentos, o que é bastante preocupante. Esta cliente teve sorte.

Como cabeleireira reconheço os resultados obtidos por esses produtos, assim como os estudos que foram feitos para que estes se adequassem aos fios cacheados, crespos e ondulados. A marca, com a sua inovadora rotina de cuidados me ensinou a cuidar adequadamente do meu cabelo e de diversas mulheres que sempre acreditaram que seus cabelos não tinham solução.

produtos

Afinal, se o rótulo não ajuda, como distinguir os produtos bons dos ruins?

O problema é que ao invés de pegar inspiração nos produtos que funcionam, se empenhando em realizar estudos para encontrar a fórmula adequada, a maioria das marcas comerciais não se embasaram em pesquisa nenhuma para cabelos crespos, e muito menos,  tiveram a sensibilidade de absorver o conceito criado, foram apenas despejando nas prateleiras de perfumarias e farmácias uma infinidade de produtos tidos como ‘adequados’, o que seduziu milhares de consumidoras com embalagens bonitas, rótulo maquiado e marketing bem trabalhado. Confesso que até eu mesma, no início.

Para quem trabalha com cachos de forma saudável e entende que abolir surfactantes pesados, silicones e derivados de petróleo faz toda a diferença a longo prazo, o susto veio em forma de clientes e mais clientes com os cabelos detonados e sem químicas. Fato notado também por colegas da mesma área. Muitas clientes diziam estar usando produtos apropriados, e muitos rótulos não diziam o contrário. Afinal, onde então estaria o problema?

O que venho percebendo como cabeleireira especializada,  é que embora em alguns rótulos não apareçam esses ingredientes sintéticos, a longo prazo os cabelos que utilizam esses produtos estão cada vez mais opacos, ressecados e com absorção de água reduzida. Ou seja, quando o cabelo não absorve a água, ele resseca, o que demonstra que há algum ingrediente sintético escondido ali, além de matérias-primas sem qualidade, que proporcionam melhores preços, mas acabam deixando o cabelo danificado a longo prazo.

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Meu objetivo nesse post não é enaltecer a Deva Curl,  pois entendo que para muitas leitoras e clientes ainda não é uma marca acessível. Já testei outras marcas e até recomendo outras linhas mais econômicas, que obtém bons resultados sem danificar os fios a longo prazo, o que é o caso da  Kah-noa e a Multi Vegetal , que também trabalho na Garagem dos Cachos. Nesta última, um produto custa em média R$30,00, o que não se difere muito dos encontrados em farmácias e perfumarias. Também estou em fase de testes com outras marcas, e em breve terei mais novidades para indicar, com excelente relação custo-benefício.

Meu objetivo é alertar as consumidoras cacheadas para que não se deixem seduzir por embalagens bonitas e boas campanhas de marketing. Mas afinal, com tantas opções no mercado, como escolher o produto mais apropriado? Uma dica que dou é fugir das marcas comerciais. Opções veganas geralmente são mais preocupadas com a composição, isentas de ingredientes sintéticos e mais econômicas, além da preocupação com o meio ambiente, é claro. O fato de uma marca pensar nos ingredientes em detrimento do marketing significa que não está preocupada em maquiar os fios a curto prazo para causar uma sensação falsa de cabelo brilhante e saudável, e sim fazer com que o próprio cabelo absorva a água necessária para se manter hidratado.

Outra sugestão que dou, para quem já investiu em alguma linha de produtos comercial é fazer a prova dos 9. Use apenas esta linha durante duas semanas, e fotografe seu cabelo dia após dia. Repare também no aumento de frizz e opacidade. Produtos ruins geralmente deixam os fios brilhantes e sedosos apenas nas primeiras aplicações. Na sequência o cabelo se torna opaco, com muito frizz e ressecamento. Se o cabelo seca muito rápido é um sinal de pouca absorção de água, ou seja, o fio está maquiado, e não hidratado, o que causa ressecamento a longo prazo, o que conclui-se que o produto não é adequado. Fios emplastados também não são bons indicadores. Principalmente se o produto se diz isento de silicones e derivados de petróleo. Lembrando que se o produto não tem ingrediente sintético, o cabelo não enjoa! O alerta, infelizmente não fica restrito apenas ao rótulo, mas aos resultados, que na maioria das vezes,acabam se mostrando apenas a longo prazo.

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    • sabrinah says:

      Não acho caro se analisarmos o custo benefício. Até porque com dois itens bons é possível ter um cabelo saudável e bonito.

  1. Oi, adorei o post! Gostaria de saber sobre marcas como a Ymasterol e Kanechom.. Essas marcas tem preços muito acessiveis e eu estou usando elas.

    • sabrinah says:

      Geralmente eu fujo das marcas comerciais, Tai. Mas o yamasterol tradicional eu conheço, acho um produto ok, mas sem grandes resultados.

  2. Gostaria de saber quais os produtos/marcas que não são tão confiáveis, que mentem na composição. Estou iniciando o tratamento sem shampoo e as vezes lavagem com shampoo leve. Já comprei alguns produtos, e não queria ter q passar pela prova dos 9 … fiquei com certo receio dessa técnica agora… meninas que já sentiram que o uso de algum produto não foi legal podem compartilhar a experiência e o produto utilizado?

    • sabrinah says:

      Conheço poucas, Raquel, e indico aqui no blog, mas já estou em bateria de testes com outras linhas e em breve teremos novidades. bjks

  3. Ótimo post!
    Confesso que fiquei muito preocupada, pois o que mais tem por aí são pessoas e empresas oportunistas. Gostaria que vc fizesse resenhas ou opinasse alguns produtos acessíveis para nós 😉

    • sabrinah says:

      Cara de matéria paga, Jaqueline, afinal, jornalista que é jornalista nunca se prende a uma única fonte, é preciso ouvir os dois lados sempre!

  4. miriam schroeder says:

    tenho cabelos lisos…mas minha filha tem molinhas bem fechadas…quase crespo(que são minha paixão)mas onde moro é difícil achar produtos bons…o mais fácil é o da bioextratus,da linha botica cachos que diz ser recomendada para no e lo poo,e o tradicional yamasterol…gostaria de saber sobre esses produtos.Desde já agradeço.

  5. Olá Sabrinah! Acompanho seu trabalho faz tempo e minha transição foi com “a sua ajuda”. Sou cacheada 2B ou 2C, não sei… Mas a dúvida é a seguinte: entendo que deva e esse multi vegetal sejam tops mas ainda pouco acessíveis (pelo menos pra mim, desempregada)… Existe alguma linha meio termo? Tipo não tão cara mas tb não tão xexelenta? Sei lá, phytoervas, bioextratos, ou alguma outra sugestão… Algo que a gente possa iniciar os cuidados!

    • sabrinah says:

      Lara, você pode começar usando como higienizador o sabonete antisséptico da granado, deste post aqui: com um condicionador da multi vegetal. Selecionei estes daqui: https://www.belezaraiz.com.br/condicionador
      O próprio condicionador pode ser deixado no cabelo como finalizador e tratamento. Ou seja, com um sabonete que custa no máximo 5 reais e um condicionador de 36 reais, você tem cabelos cuidados por um bom período. Infelizmente, as marcas comerciais ainda deixam a desejar, e não tenho como recomendá-las apesar do preço atrativo. Recebo diariamente clientes com os cabelos danificados, que têm certeza que seguem a rotina correta, mas o resultado não demonstra isso. Espero ter ajudado. bjks

  6. Comprei o sabonete e o condicionador conforme a sua indicação. Para começar a usa-los tenho que fazer algum tipo de lavagem diferente? Um shampoo com sulfato pra limpar bem?

  7. deixei de usar marcas comerciais, uso as mascaras artesanais da Paula Breder( são mais caras mais vale a pena) ao final o custo beneficio compensa, e faço mascaras naturais, uso muito pouco creme de pentear , sinto que meu cabelo não necessita mais tanto, quando eu usava as comercias era uma por mês rsss.Acho que virou um comercio grande as blogueiras indicam um produto novo “maravilhoso” todo dia.

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