” Crescer em uma sociedade regada de preconceito não é nada quando sua família te orienta a quebrar esses paradigmas e se aceitar. O que aconteceu comigo e com minha irmã Carolina**, foi justamente o oposto. Embora, minha mãe, que é negra, tentasse valorizar nossas raízes africanas, na do meu pai, o preconceito vinha a todo o vapor.

IMG_7814

Cresci ouvindo que  meus seios e bunda eram grandes e feios, pois eram herença da minha avó materna negra. Isso sem contar o que ouvi em relação ao meu nariz: que era tido como enorme e horrível. Meu cabelo, claro, não podia ficar de fora, era taxado de bombril, fuá. Como morávamos no quintal de nossa avó paterna, ficava difícil não ouvir frases preconceituosas diariamente.

IMG_7807

S.T.* sentiu desde a infância o preconceito étnico no próprio seio familiar

Certa vez, quando tinha dois anos e brincava com meu amiguinho da época, um vizinho negro, fui repreendida pela minha avó: – Não brica com ele não filha, ele tem a cor feia . Nesta mesma hora, me lembro que minha mãe interviu, dizendo que não podia ter preconceito étnico pois eu era negra, assim como ela.

IMG_7809

Na infância de S.T.* foi difícil não absorver o racismo, passado de geração

Por outro lado, eu e meus irmãos, havíamos internalizado estes preconceitos, pois sempre ‘brincávamos’ de forma ingênua com isso, dizendo que o nariz de batata e o cabelo crespo era herança de nossa mãe, sendo que o restante de nossa descendência era indígena e portuguesa.

IMG_7815

Com os fios alisados

Um belo dia, quando fiz seis anos, minha avó saiu comigo, e para a surpresa da minha mãe, voltei deste passeio,alisada.  Às escondidas, ela havia me prometido um visual lindo e perfeito, que era justamente o contrário do que eu era. Para minha mãe que sempre foi calada, restaram lágrimas e raiva. Dessa forma, cresci odiando meu cabelo e meu corpo, que eu tentava esconder usando roupas com tamanhos maiores.

IMG_7816

Em transição

As dobrinhas e sobrepeso foram decorrentes das vitaminas que minha vó me dava escondido da minha mãe, para engordar. Elas fizeram efeito aos nove anos, época em que a Carolina**nascia. Foi quando tive um distúrbio de peso e ganhei o apelido de ‘Gisele Bucho” da mesma vó. Nesta fase, passei a interagir mais com homens e usar roupas do meu pai, em conjunto com boné e pochete. Afinal, gorda e feia daquele jeito, que menina iria querer brincar comigo?

IMG_7818

Já feliz com os cachinhos naturais pós big chop

Essa fase durou até uns 17 anos, quando comprei meu primeiro short e passei a usar roupas femininas. Neste mesmo período, me cansei de ter minha raíz queimada com produtos fortíssimos, para deixá-los alisados. Revolvi assumir meus cachos, e com eles, comecei a resgatar a autoestima perdida. 

IMG_7810

S.T.* fez as pazes com seu corpo e cabelo simultâneamente

Passei pela transição tranquilamente, e nesse meio tempo comecei a aceitar meu corpo, o nariz batatinha, a bunda e os seios avantajados, o sorriso largo e até o astigmatismo. Quando fiz o big chop, foi a fase que eu e minha irmãzinha mais nos aproximamos. Ela ouvia as mesmas frases preconceituosas de minha avó, que ouvi quando era criança, mas a diferença é que ela cresceu ouvindo de mim e da minha mãe que seus cachos eram lindos. E quando assumi os meus, foi maravilhoso para ela.  Foi então que em 2014, a intromissão da minha avó paterna mudou tudo mais uma vez.” (Mas essa história, da irmã de S.T.*, Carolina** , de 13 anos, vocês só ficarão conhecendo no post de quinta-feira.)

*S.T. é uma sigla criada para preservar a identidade da autora, que autorizou apenas a publicação das fotos e história

**O nome da irmã também foi alterado pelo mesmo motivo.

retranca_cachos

Gostou da história da S.T.*? Quer ler outras histórias de superação? Clique aqui! Quer ver a sua história publicada neste espaço? Escreva para cachosefatosoficial@gmail.com, com Meu Cabelo, minha história no assunto. Fotos são obrigatórias.

Deixe um Comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

<a href="" title=""> <abbr title=""> <acronym title=""> <b> <blockquote cite=""> <cite> <code> <del datetime=""> <em> <i> <q cite=""> <s> <strike> <strong>

Comentários no Facebook