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Márcia Martins de Oliveira, conhecida como Márcia Turbanista, devido ao trabalho magnífico que desenvolve com turbantes, já estava na minha mira de possíveis entrevistadas há alguns anos. Finalmente, tive o privilégio de fazer esta entrevista com ela, que tem uma trajetória de vida espetacular, onde o big chop veio como ponto de partida numa série de mudanças: um segundo casamento, o bebê Jacob, novas descobertas, e claro, os turbantes.

O que começou como uma tentativa de autoaceitação, acabou  tomando uma proporção tão grandiosa em sua vida, que virou uma profissão. O apoio do marido, Cob, foi fundamental. Ele a incentivou desde o início, quando a própria Márcia ainda não havia dado conta do seu potencial.

Ainda me recordo da imagem daquele pai presente, agarrado ao Jacob através do ‘sling’, aquele pano, que segura o bebê junto ao corpo, sem a necessidade das mãos, enquanto a própria Márcia encarava o desafio do seu primeiro trabalho com os turbantes, no Encrespa Geral 2013, no Parque da Água Branca, onde a conheci.

As oficinas  permitiram que ela conseguisse unir o que mais ama na vida: a família e o amor pelo que faz, e essa receita de felicidade é o que ela transmite em seu trabalho. Sua arte com turbantes ajuda mais e mais mulheres a se empoderarem, seja na aceitação do cabelo natural, à descoberta como mulher negra, e até mesmo como bálsamo para aliviar o sofrimento daquelas que são surpreendidas por um câncer e se deparam com a cabeça nua pela primeira vez. Participar do processo de autoestima de crianças negras desde o início é uma das partes mais significantes deste trabalho para ela.

Márcia, que já trabalhou com o embaladora de cotonetes, atendente de call center e operadora de máquinas, hoje tem em suas mãos uma rica missão: empoderar outras mulheres, que assim como ela, sentiram na pele o racismo, mas que conseguiram dar a volta pro cima através do resgate da autoestima, e com isso, estão dominando o mundo com muito amor e luz. É o que eu chamo de uma verdadeira rede colaborativa de felicidade, onde Márcia, sem dúvida nenhuma, tem um papel fundamental.

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Através do trabalho com turbantes, Márcia conseguiu conciliar família, trabalho e o prazer de ajudar outras mulheres no resgate de sua autoestima.

Sabrinah Giampá – Como você começou o trabalho com turbantes?

Márcia Martins de Oliveira – O trabalho com o turbantes teve início após o meu BC, que na época, eu nem sabia o que era! Cortei o cabelo porque estava cansada da química, porém tive dificuldade com a aceitação do novo. Eu passei por um processo de mudança muito grande na minha vida, onde o ponto de partida foi o big chop. Esta primeira mudança desencadeou muitas outras.

Sabrinah Giampá – Fale sobre essas outras mudanças.

Márcia Martins de Oliveira – A primeira delas foi buscar alternativas para cuidar e tratar do meu cabelo natural. Estava muito confusa, e nem sabia por onde começar. Daí, encontrei o grupo Amigas Cacheadas, no facebook, e fiquei muito feliz, porque havia descoberto que não era a única na escolha de libertação da química. Eu assistia diversos vídeos como fonte de inspiração, e estava sempre buscando alternativas para melhorar a autoestima, e foi em um desses momentos que o turbante entrou na minha vida.

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Com o tempo, busquei mais informações sobre os turbantes, e fui aprendendo a fazer vários tipos de amarração. E a prática veio do dia a dia, e com ela, veio também a vontade de compartilhar o que eu estava vivenciando, e assim o fiz. Passei a compartilhar este meu aprendizado, e com isso, tenho ajudado as meninas em transição, que assim como eu, há três anos atrás, não sabia por onde começar.

Sabrinah Giampá- E como foi esse primeiro contato com o turbante?

Márcia Martins de Oliveira – A princípio, pra mim  era apenas um lenço. Ainda sem muito conhecimento, cheguei até a pensar que o lenço chamaria menos atenção que o meu cabelo crespo e curto( kkkk nunca! ), mas tudo é aprendizado e aceitação. Com o tempo, busquei mais informações sobre os turbantes, e fui aprendendo a fazer vários tipos de amarração. E a prática veio do dia a dia, e com ela, veio também a vontade de compartilhar o que eu estava vivenciando, e assim o fiz. Passei a compartilhar este meu aprendizado, e com isso, tenho ajudado as meninas em transição, que assim como eu, há três anos atrás, não sabia por onde começar. Ter um ponto de partida para criar suas próprias amarrações muda tudo, e é esse o meu incentivo, sempre!

Sabrinah Giampá – E como a oficina de turbantes se tornou uma profissão?

Márcia Martins de Oliveira- Quem me apoiou desde o início foi meu marido, o Cob, sou grata a Deus por ter ele como meu companheiro pra todas as horas. Antes de trabalhar com turbantes, eu fui embaladora de uma empresa de cotonetes, operadora de máquinas e atendente de call center. Hoje faço oficinas em diversos locais, como: Sesc, Casa de Cultura, Centro Cultural, sindicatos,Parques, Festival Afro, Feira de Cosméticos, Shoppings. Meu objetivo é mostrar que arte e cultura são para todos,assim como as nossas escolhas. Eu escolhi ser livre!

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Márcia, que hoje participa de diversas oficinas de turbantes, viu sua nova paixão se transformar em uma profissão naturalmente

Sabrinah Giampá – O que eu gostaria de entender é como foi o seu processo de transição de uma profissão para outra. 

Márcia Martins de Oliveira- Depois de me casar com o Cob, no dia do meu aniversário (12/04/12), tudo começou a mudar na minha vida.  Fui demitida uma semana depois, e havia tirado as tranças seis dias antes de me casar, quando fiz meu BC. A primeira oficina de turbantes aconteceu porque não tinha nenhuma pessoa para fazer e a bomba caiu no meu colo. Tive muito receio e insegurança, mas meu marido, como sempre, me encorajou, dizendo que acreditava no meu potencial. Então, lá estávamos nós, com nosso filho, Jacob, na primeira oficina de turbantes durante o Encrespa Geral de março de 2013.

Sabrinah Giampá – Mas depois deste encrespa, você se sentiu mais segura para encarar outros desafios como este? Como foi o processo de surgimento de novos trabalhos e a confiança em si mesma e neste talento recém descoberto?

Márcia Martins de Oliveira –Sim…mas até hoje ainda sinto um frio na barriga quando vou ministrar uma Oficina, mas é de emoção (kkk). Ainda fico emocionada com o carinho que recebo de adultos, adolescentes e principalmente das crianças.  Em relação aos trabalhos, vários coletivos começaram a me chamar para fazer oficina após o Encrespa. Então, diante deste novo cenário, meu marido sugeriu mudar de cargo, se mantendo na prefeitura, onde trabalhava, e começou a prestar concurso, para que pudesse trabalhar de segunda à sexta, e eu nos fins de semana, pois depois que apareceram as oficinas, ele viu o quanto isso estava me fazendo bem. O bom é que estamos sempre todos juntos, porque ele me acompanha e não preciso deixar meu filho, e isso é uma realização.

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O pequeno Jacob que acompanha a mãe em todas as oficinas

Ajudar outras pessoas. ..isso é um presente de Deus. Vejo todos os dias muitas mulheres se libertando dos padrões de beleza, se sentindo livres, sem se preocupar com opiniões alheias ou piadas racistas em relação ao crespo natural. Vejo crianças aprendendo que cada pessoa tem uma textura de cabelo, que o crespo é lindo.Vejo isso na minha neta, quando me pede para colocar um turbante nela. A representatividade é muito importante para as crianças.

Sabrinah Giampá – Sem dúvidas! Você acredita que o turbante tem o papel de resgatar a autoestima de crespas e cacheadas, e principalmente das mulheres negras, que passam por um processo de aceitação da própria raça e etnia? Como você percebe este processo no seu dia a dia?

Márcia Martins De Oliveira- Acredito que o através do uso do turbante mulheres negras resgatam sua identidade, e assim, passam a descobrir sua essência, elevando a autoestima. O mesmo acontece com mulheres brancas que perderam seus cabelos devido à quimioterapia, elas aprendem a amarrar um lenço com uma outra visão que não seja do sofrimento causado pelo tratamento contra o câncer.  Também vejo muitos casos de mulheres que me procuram em situação de queda capilar decorrente de procedimentos químicos, e que não se sentem bem com a transição. Então elas usam o turbante para tornar este momento menos tortuoso.

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Sabrinah Giampá- E o que é mais gratificante nestas oficinas? Imagino que ajudar outras mulheres a se libertarem de preconceitos e estereótipos, e valorizarem sua real beleza tenha sido um processo enriquecedor na sua vida, e não apenas um trabalho qualquer.

Márcia Martins De Oliveira – Ajudar outras pessoas. ..isso é um presente de Deus. Vejo todos os dias muitas mulheres se libertando dos padrões de beleza, se sentindo livres, sem se preocupar com opiniões alheias ou piadas racistas em relação ao crespo natural. Vejo crianças aprendendo que cada pessoa tem uma textura de cabelo, que o crespo é lindo.Vejo isso na minha neta, quando me pede para colocar um turbante nela. A representatividade é muito importante para as crianças. Ver as mães usando turbantes nos filhos, e muitas outras, que iniciaram trabalhos com a  oficina de turbante com base no que eu ajudei, passando isso para outras mulheres, não tem preço!Trabalhar fazendo o que se gosta é maravilhoso. Fico muito feliz quando me pedem orientações do que usar, e no que vale a pena investir, principalmente quando vejo estas pessoas seguindo essas orientações e conseguindo ótimos resultados, é muito gratificante.

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Até hoje ainda sinto um frio na barriga quando vou ministrar uma Oficina, mas é de emoção (kkk). Ainda fico emocionada com o carinho que recebo de adultos, adolescentes e principalmente das crianças.

Sabrinah Giampá – O que mudou na Márcia quando ela se tornou a Márcia Turbanista?

Márcia Martins de Oliveira – Mudou tudo! Aprendi a me valorizar como a mulher que me tornei,aprendi a respeitar as escolhas do próximo, aprendi a não aceitar ofensas calada, aprendi e vivo aprendendo. Hoje não penso em agradar aos outros, e sim a mim mesma.

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